sexta-feira, 8 de outubro de 2010

O tom do recado – Miriam Leitão

O tom do recado – Miriam Leitão

O Globo

A pergunta feita a um empresário, numa conversa com várias pessoas, foi:
“É verdade que emissários do PT telefonam para empresas avisando que sabem
quem não está fazendo doações para a campanha?”

O empresário respondeu: “Para mim, telefonaram e foram pessoalmente dizer
que notaram que eu não tinha feito doação na última eleição nem tinha feito
ainda nesta.”

Eu ouvi essa conversa estarrecedora. Esse tipo de encaminhamento do pedido de
doação, se estiver generalizado, é uma forma de ameaça.
A frase: “Notamos que você não fez doação na última eleição e ainda não fez nesta”
pode ser entendida pelo que está embutido: estamos de olho em você.

O Estado, hoje, é quem concede a maioria do crédito; o BNDES aumentou de
forma extravagante suas concessões de empréstimo subsidiado e a arbitrariedade
de suas escolhas dos “campeões”, que o faz negar créditos a alguns e conceder em
excesso a outros que, na visão do banco, estão mais aptos a vencer a competição
global.
A mistura é explosiva: de um lado, um Estado com poder de vida e morte sobre
as empresas; de outro, emissários do partido do governo com uma ameaça
embutida na formulação do pedido.

Hoje, um dos grandes riscos que a sociedade brasileira corre é exatamente esse
poder excessivo do Estado, controlado como donataria pelo partido do governo.
O Estado é o grande comprador, o grande financiador, o grande sócio em
qualquer empreendimento. Como ficar contra ele?

Por outro lado: ficando a favor dele, que grandes vantagens se pode ter!
Os empresários só falam mal do governo se seus nomes não aparecerem; todos
eles estão sendo beneficiados por alguma grande obra, algum grande contrato,
alguma licença; ou sonham ser beneficiados no futuro.

Um dos maiores empresários do país foi chamado para uma conversa cheia de
ameaças indiretas por ele ter feito declarações contra uma das polêmicas
obras que promete ser sorvedouro de dinheiro público.

O governo cooptou movimentos sociais, sindicalistas, parte do movimento
cultural, através da distribuição de benesses, patrocínios, contratos e financiamentos.
Mas a cooptação dos empresários é mais direta.

Algumas empresas não têm capacidade alguma de bancar os empréstimos que
recebem, ou outras são viabilizadas por aderirem aos grandes projetos em que
todo o risco é público.

Nas sombras de um Estado gigante, tudo viceja, como os intermediários de
negócios, mesmo que eles não tenham delegação para entregar o que prometem.
Com um Estado todo poderoso, qualquer espertalhão pode dizer que é a ligação
direta com quem decide e pedir uma comissão para isso.

Mesmo que não houvesse casos de corrupção, comprovadamente ligados ao
governo, ainda assim, seria o ambiente certo para a propagação dos casos
nebulosos de pedidos de propina.



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